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terça-feira, 4 de junho de 2013

Aécio e ‘O papel da oposição’, de FHC

Oposição: “O fato é que a primeira grande tese de FHC foi muito bem compreendida por Aécio e está na raiz do que ele disse na TV.”


Oposição: Aécio Neves e FHC


FHC e Aécio Neves: "O papel da oposição"

FHC e Aécio Neves: “O papel da oposição”

Fonte: Valor Econômico publicado pelo Jogo do Poder

Aécio na linha direta de FHC


Artigo: Renato Janine Ribeiro

Não surpreende que Aécio Neves seja o candidato à Presidência da República ungido por Fernando Henrique Cardoso. É que seu programa no horário político do PSDB, iniciando de fato a propaganda eleitoral, traduz em linguagem televisiva e popular um artigo seminal do ex-presidente, que causou impacto dois anos atrás, mas confinado na época a um debate quase acadêmico. Refiro-me a “O papel da oposição“, que saiu no número 13 da revista “Interesse Nacional“, criada pelo embaixador Rubens Barbosa, um dos melhores cérebros próximos a FHC. O artigo pode ser lido no site da revista e em outros endereços na internet.

O que dizia o artigo? Se resumirmos não só o que Fernando Henrique disse com todas as letras, mas também as implicações menos visíveis mas inegáveis, seria o seguinte. O PSDB não tem como rivalizar com o PT junto aos mais pobres. As propostas tucanas são para a classe média. Mas esta última cresce. Os petistas não terão muito o que lhe dizer. O PSDB terá. E deve em especial lutar no âmbito de uma nova forma de relações sociais, que são as virtuais, as proporcionadas pela comunicação via internet. Falou assim primeiro o cientista político, ao mostrar os limites dos discursos tanto petista quanto tucano, e depois o sociólogo, ao pensar em novas relações sociais – o sociólogo que, quando foi presidente da República, se entusiasmava em dizer que estamos à beira de uma nova Renascença, o presidente que tinha por amigo Manuel Castells, um dos grandes teorizadores das possibilidades que nos abre a rede mundial de computadores. Para tanto, aliás, FHC criou a rede Observador Político, iniciativa que pretendia ser não-partidária e abrir um canal de discussão mais rico sobre a política.

Vamos reconhecer que a segunda parte do que disse FHC continua no plano das intenções, mas isso não é falha sua. Nossa sociedade, dominada pelo narcisismo, tem dificuldade em dialogar com o outro, em especial se for mesmo diferente de nós. As oportunidades que abre a Internet são destroçadas pela multiplicação de Narcisos. Mas isto fica para outro dia. O fato é que a primeira grande tese de FHC foi muito bem compreendida por Aécio Neves e está na raiz do que ele disse na TV.

Aécio quer tirar a classe média de Dilma


Quando o senador mineiro diz que devemos ir além do Bolsa Família, está implicitamente reconhecendo o êxito e até a autoria petista da grande expansão dos programas sociais. Sim, ele recorda que foram tucanos os que os começaram. Mas isso é “pro forma”. O fato é que os governos Lula e Dilma são os grandes responsáveis pela transformação de nossa pirâmide social em losango – o processo pelo qual as classes mais pobres deixaram de ser as mais numerosas, papel que hoje é da chamada classe C; entre 2005 e 2010, cerca de 50 milhões passaram das classes D e E para a nova classe média. Então, por que brigar com a realidade? Por que atacar isso, quando o segredo que desvenda FHC é que esse processo pode ter como beneficiário, justamente, o PSDB?

Em outras palavras, se o sonho de Dilma Rousseff é fazer do Brasil “um país de classe média”, e se quem sabe falar à classe média e dar-lhe o que ela quer é o PSDB, então o interesse maior dos tucanos é que a presidenta e seu partido tenham pleno êxito em seu projeto. E o problema do PT, que os tucanos terão enorme prazer em apontar, seria tratar-se de um partido bom para vencer as grandes mazelas sociais, mas incapaz de dar um passo adiante – um partido bom para a emergência social em que vivemos estes séculos, com níveis de miséria e discriminação absolutamente indignos, mas incapaz de garantir, depois disso, um crescimento econômico e um desenvolvimento social sustentáveis. (E com esta ideia de sustentabilidade o PSDB pode também fazer acenos aos que apoiaram ou apoiam Marina Silva, cuja palavra de ordem foi deixando de ser “o verde”, ou o meio ambiente, para se tornar a sustentabilidade em geral).

PT seria capaz de medidas emergenciais. O Bolsa-Família pode ser o melhor programa de inclusão social do mundo, mas ninguém vai – ou deve – prosperar graças à assistência. É preciso criar empregos e empreendedorismo. A desigualdade étnica no País é escandalosa e as ações afirmativas são importantes para reduzi-las. Mas, em ambos os casos, trata-se de medidas pontuais, que têm de ser provisórias, pois apenas serão eficazes se tiverem data de conclusão próxima de nós no tempo. Assim, esperam FHC – e, agora, Aécio – construir, com políticas liberais, uma alternativa mais bem sucedida ao PT na conquista deste público, a classe média baixa.

Pela primeira vez desde 2002, o PSDB pode ir à campanha propondo, de fato, o que Serra formulou em palavras – mas que não convenceram o eleitorado – em 2010: continuidade em relação aos êxitos petistas. Ele passa a ter claro interesse em que o petismo realize o sonho de Dilma. Exagerando, ele pode até ser educadíssimo com o PT… Comparando, estamos numa situação análoga, ainda que com sinais invertidos, à de 2002. Lula tinha interesse em que o Brasil, que ia receber de FHC, estivesse bem. E a “herança maldita” estava longe de ser tão má, porque passar o cargo a um presidente eleito de esquerda era algo inédito em nosso país.

Parece que o país quer continuidade com mudanças, ou mudanças com continuidade. Quem nos convencer que fará isso ganha. Pessoalmente, não acredito que 2014 seja já a vez de Aécio; mas sua estratégia é boa, e o é porque deve muito a este artigo de FHC, que merece ser lido por quem ainda não o conhece. E fica o alerta para o PT. O desafio aumenta. Não vai ser fácil guardar a hegemonia política no país.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo. Escreve às segundas-feiras para o Valor

FHC: PT e a gestão eficiente do PSDB

Gestão Eficiente: “Sem coragem para fazer autocrítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB”, diz FHC.




Gestão Eficiente: PSDB


Beijar a cruz - artigo: Fernando Henrique Cardoso

Beijar a cruz – artigo: Fernando Henrique Cardoso

Fonte: O Estado de S.Paulo

Beijar a cruz


Artigo: *Fernando Henrique Cardoso

Já passou da hora de o governo do PT beijar a cruz. Afinal, muito do que ele renegou no passado e criticou no governo do PSDB passou a ser o pão nosso de cada dia da atual administração. A começar pelos leilões de concessão para os aeroportos e para a remodelação de umas poucas estradas.

No início procuravam mostrar as diferenças entre “nós” e “eles”, em seu habitual maniqueísmo. “Nossos leilões”, diziam, visam a obter a menor tarifa para os pedágios. Ou, então, afirmavam: nossos leilões mantêm a Infraero na administração dos aeroportos. Dessas “inovações” resultou que as empresas vencedoras nem sempre foram as melhores ou não fizeram as obras prometidas. Pouco a pouco estão sendo obrigados a voltar à racionalidade, como terão de fazer no caso dos leilões para a construção de estradas de ferro, cuja proposta inicial assustou muita gente, principalmente os contribuintes. Neles se troca a vantagem de a privatização desonerar o Tesouro pela obsessão “generosa” de atrair investimentos privados com o pagamento antecipado pelo governo da carga a ser transportada no futuro…

Ainda que renitente em rever acusações feitas no passado (alguns insistem em repeti-las), a morosidade no avanço das obras de infraestrutura acabará por levar o governo petista a deixar de tentar descobrir a pólvora. Já perdemos anos e anos por miopia ideológica. O PT não conseguiu ver que os governos do PSDB simplesmente ajustaram a máquina pública e as políticas econômicas à realidade contemporânea, que é a da economia globalizada. Tomaram a nuvem por Juno e atacaram a modernização que fizemos como se fosse motivada por ideologias neoliberais, e não pela necessidade de engajar o Brasil no mundo da internet e das redes, das cadeias produtivas globais e de uma relação renovada entre os recursos estatais e o capital privado.

Sem coragem para fazer autocrítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB e agora os críticos do mais variado espectro cobram deste o suposto fato de não ter propostas para o Brasil… Entretanto, a versão modernizadora do PT é “envergonhada”. Fazem mal feito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estivesse no comando.

Agora chegou a vez dos portos. Alberto Tamer – e presto homenagem a quem faleceu deixando um legado de lucidez em suas colunas semanais -, na última crônica que fez no jornal O Estado de S. Paulo, Foi FHC que abriu os portos (17/2), recordava o esforço, ainda no governo Itamar Franco, quando Alberto Goldman era ministro dos Transportes, para dinamizar a administração portuária, abrindo-a à cooperação com o setor privado, pela Lei 8.630, de 1993. Caro custou tornar viável aquela primeira abertura quando eu assumi a Presidência. Foi graças aos esforços do contra-almirante José Ribamar Miranda Dias, com o Programa Integrado de Modernização Portuária, que se conseguiu avançar.

Chegou a hora para novos passos adiante, até porque o Decreto 6.620 do governo Lula aumentou a confusão na matéria, determinando que os terminais privados só embarcassem “carga própria”. Modernizar é o que está tentando fazer com atraso o governo Dilma Rousseff. Mas aos trancos e barrancos, sem negociar direito com as partes interessadas, trabalhadores e investidores, sem criar boas regras de controle público nem assumir claramente que está privatizando para aumentar a eficiência e diminuir as barreiras burocráticas. Corre-se o risco de repetir o que já está ocorrendo nos aeroportos e estradas: atrasos, obras mal feitas e mais caras, etc. No futuro ainda dirão que a culpa foi “da privatização”… Isso sem falar do triste episódio das votações confusas, tisnadas de suspeição, e de resultado final incerto no caso da última Lei dos Portos.

A demora em perceber que o Brasil estava e está desafiado a dar saltos para acompanhar o ritmo das transformações globais tem sido um empecilho monumental para as administrações petistas. No caso do petróleo, foram cinco anos de paralisação dos leilões. Quanto à energia em geral, a súbita sacralização do pré-sal (e, correspondentemente, a transformação da Petrobrás em executora geral dos projetos) levou ao descaso no apoio à energia renovável, de biomassa (como o etanol da cana-de-açúcar) e eólica. Mais ainda, não houve preocupação alguma com programas de poupança no uso da energia. Enfim, parecem ter assumido que, já que temos um mar de petróleo no pré-sal, para que olhar para alternativas?

Acontece, entretanto, que a economia norte-americana parece estar saindo da crise iniciada em 2007-2008 com uma revolução tecnológica (de discutíveis efeitos ambientais, é certo) que barateará o custo da extração dos hidrocarburetos e colocará novos desafios ao Brasil. A incapacidade de visão estratégica, derivada da mesma nuvem ideológica a que me referi, acrescida de um ufanismo mal colocado, dificulta redefinir rumos e atacar com precisão os gargalos que atam nossas potencialidades econômicas ao passado.

Não é diferente do que ocorre com a indústria manufatureira, quando, em vez de perceber que a questão é reengajar nossa produção nas cadeias produtivas globais e fazer as reformas que permitam isso, se faz uma política de benefícios esporádicos, ora diminuindo impostos para alguns setores, ora dando subsídios ocultos a outros, quando não culpando o desalinhamento da taxa de câmbio ou os juros altos (os quais tiveram sua dose de culpa) pela falta de competitividade de nossos produtos.

As dificuldades crescentes do governo em ver mais longe e administrar corretamente o dia a dia para ajustar a economia à nova fase do desenvolvimento capitalista global (como o PSDB fez na década de 1990) indicam que é tarde para beijar a cruz, até porque o petismo não parece arrependido. Melhor mudar os oficiantes nas eleições de 2014.

* SOCIÓLOGO,  FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA


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